(ABANDONO, MISÉRIA E UTOPIA)
“O sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão”.
Adaptado da net por: Claudio F
Ramos, 07/05/2017. Cacau “:¬)
A ESTÉTICA
- “El hombre era alto y tan flaco que parecía siempre de perfil.”
·
Eis o líder Antônio Conselheiro, no romance de
Mario Vargas Llossa, “LA GUERRA DEL FIN
DEL MUNDO”.
· Não era nem tão alto nem tão magro. No entanto a descrição é perfeita. Llosa captou bem o espírito do Conselheiro, ao esboçar-lhe os traços físicos.
A PERSONALIDADE
- Um homem ascético, um místico com pudor de
santidade, líder que não guiava o povo, mas irradiava paz e confiança.
·
Um homem manso, mas que vai levantar-se contra as
injustiças.
· Um homem que não decreta a guerra nem a ela incita, mas endurece quando chega a batalha.
AS CALÚNIAS
- Antônio Conselheiro é um dos personagens mais
caluniados da história do Brasil.
·
Fanático, louco, supersticioso, traidor, ignorante
e arruaceiro – dos documentos oficiais estes rótulos passam aos livros de
história.
· Apenas recentemente começou a mudar a imagem falsa que construíram para Conselheiro.
A ORIGEM
- Nasceu no Ceará, em 1828, na vila de
Quixeramobim.
·
Aos seis anos fica órfão de mãe.
·
Antes de completar oito, o pai casa-se de novo e o
menino Antônio Vicente Mendes Maciel será muito maltratado pela madrasta.
·
Torna-se tímido e lembrará a infância como um
“período de dor”, mas aprende aritmética, geografia, latim e francês.
·
Aos vinte e sete anos, com a morte do pai, toma
conta da venda da família.
·
Está cheio de dívidas que paga a duras penas.
·
Casa-se com uma prima.
·
Abandona o comércio, vai ser empregado e finalmente
juiz de paz em Campo Grande.
·
Vive em Ipu, onde se torna requerente do fórum.
· O casamento não dá certo e sua mulher foge com um soldado.
O ANDARILHO
- Com o fim do casamento Antônio Conselheiro começa
a perambular pelo sertão.
·
Conhecia o sofrimento do povo, a quem defendia no
fórum.
·
Nas suas andanças entra em contato íntimo com a
miséria.
·
Liga-se à Joana Imaginária, escultora de imagens em
barro e madeira, e o misticismo vai tomando conta da sua vida.
·
Com Joana tem um filho e deixa ambos em 1865.
· Andando, vai para Pernambuco e Alagoas. Passa por Sergipe e chega à Bahia.
O CONSTRUTOR
- Já não vaga à toa.
· Vai construindo cemitérios e igrejas de elegante arquitetura, a pedido dos padres.
A TRANSFORMAÇÃO
- Assume a imagem do conselheiro que entra para a
história: uma bata azul, barbas grisalhas, alpercatas e bordão.
· Come frugalmente – frutas e verduras.
O PREGADOR
- É quando começam a vigiá-lo, porque embora seu
discurso seja católico, diverge um tanto dos padres.
·
Percebe que os padres estão sempre do lado dos
fortes e ricos; fica com os humildes.
·
Uma espécie de anarquista místico: figura
impressionante com sua barba e bata azul, chapelão, bolsa com livros e caderno
onde anota o que pensa.
·
Fala contra o latifúndio, diz que a salvação do
homem virá pelas suas obras e declama os evangelhos em latim.
· Discursa vibrando o bordão, escandindo as palavras.
A AMEAÇA
- Não demora, é preso: o povo já o ouvia
atentamente, era um perigo à ordem.
·
Em 1876, não tendo do que acusá-lo a não ser de
falar a verdade, denunciam-no como assassino da mãe e da esposa.
·
Inventa-se uma história fantástica para explicar
como ele matou a mãe: ela o havia convencido a simular uma viagem e
esconder-se, para comprovar a traição da mulher. Assim fez. Escondido, viu um
vulto chegar à sua casa e preparar-se para pular a janela. Seria o amante da
mulher: Conselheiro matou–o a tiros. Em seguida entrou e assassinou a mulher.
·
Quando foi conhecer o amante, virando o cadáver,
descobriu que era sua mãe , autora da intriga para que ele matasse a mulher.
·
A partir daí começam a explicar a peregrinação de
Antônio Maciel pelos sertões: estaria alucinado e pretendia compensar o
assassinato de sua mãe com sua louca pregação.
·
A história, evidentemente mentirosa, pois sua mãe
morreu em 1834, quando ele tinha seis anos, e a sua esposa estaria viva em
Sobra, serviu para enviá-lo preso a Salvador.
· Nunca quis falar sobre o “crime” às autoridades, preferindo responder a qualquer pergunta com sua pregação mística, o que aumentava a crença de que era mesmo assassino e, sobretudo, louco.
A PRISÃO
- A prisão de Antônio Conselheiro inquieta o povo.
·
As autoridades baianas mandam-no para o Ceará, com
a recomendação de não o deixarem voltar à Bahia, onde os padres não o viam com
bons olhos.
·
Em Fortaleza, para onde o remetem, chega maltratado
pelas torturas.
· É a própria imagem de um santo do sertão: magro, seco, vegetariano, dormindo no chão duro e falando que é preciso obter o céu aqui na terra.
A MISSÃO
- Finalmente em 1º de julho de 1876 libertam-no.
·
De tudo, ele tira um ensinamento: é pior difamar do
que agredir um homem.
·
Nas suas prédicas, ao comentar a injusta prisão,
cita Santo Agostinho: “Mas ofenderam Nosso Senhor Jesus Cristo seus inimigos
d’Ele murmuraram do que quando o crucificaram.”, como relata Edmundo Moniz em A
guerra social de Canudos.
·
Livre ele volta à Bahia.
·
Agora tem uma missão. Fez o seu aprendizado e soube
o preço.
·
Não é um louco e menos um vagabundo, com a
“tendência acentuada para a atividade mais inquieta e mais estéril, o descambar
para a vadiagem mais franca”, como afirma preconceituosamente Euclides da
Cunha.
· É um líder do povo
DEUS E O DIABO NO SERTÃO
- Deus e o diabo pelejam na terra do sol.
·
A terra é o próprio inferno, terra do cão, por isso
ele sempre vence. A batalha tem que ser ganha trazendo o céu para a terra.
Então venceremos o Satanás.
·
Não é coisa de doido. Não é fanatismo.
·
É o povo que entende da pregação de Antônio
Conselheiro, quando ele propõe um cristianismo primitivo nos sertões da
Bahia.
·
O povo viu os bons morrerem pela independência, ali
mesmo na Bahia, e ela não veio, ou chegou para os ricos continuarem explorando.
·
Assistiu o13 de maio e continuou escravo: não tinha
mais pelourinho, mas o jagunço do senhor de terras substituiu mais brutalmente
o capitão-do-mato, expulsando o lavrador das roças.
· E por fim, a malfadada república, coisa de ateus e maçons, confirmando o mando do coronel e garantindo suas terras ociosas.
OS “FANÁTICOS”
- Essa visão simples e mitificada não é, apesar das
aparências, alienada ou mística. Ela trata de entender, sentir e viver
criticamente uma situação que não se pode teorizar, pela própria opressão
social e política da sociedade brasileira.
·
Não sabendo explicar teoricamente, não sendo
possível planejar politicamente, aplica uma espécie de “crítica mágica” para
repudiar a realidade.
·
O misticismo no caso, deixa de ser uma alienação
para ser a única arma do sertanejo.
·
Esse peculiar “sentir religioso” é uma forma
de separar-se ideologicamente das classes dominantes.
· Lembrando Feuerbach (filósofo ateu alemão), Rui Facó, em Cangaceiros e fanáticos, diz que:
“Ao elaborarem variantes do cristianismo, as populações oprimidas do sertão separavam-se ideologicamente das classes e grupos que as dominavam, procurando suas próprias vias de libertação. As classes dominantes, por sua vez, tentando justificar o seu esmagamento pelas armas – e o fizeram sempre – apresentavam-nas como fanáticos, isto é, insubmissos religiosos extremados e agressivos.”
O CATOLICISMO REPRESSOR
- O sertanejo criou sua religião própria, citando
ainda Facó, que lhe serve de instrumento para a luta libertária.
·
A igreja, por outro lado, estabelece uma “religião
oficial”, denunciando estes “desvios” libertários das massas como ofensa aos
seus dogmas, quando na verdade ofendem essencialmente o sistema de poder.
· Em Canudos, como em muitos outros movimentos, a igreja fez “o papel de polícia ideológica no meio rural, antecipando-se às forças repressivas”.
O MARASMO HISTÓRICO DO BRASIL
- Um dos dramas do povo brasileiro é essa
incapacidade de dar o passo decisivo nos grandes momentos históricos.
·
Ao separar-se o Brasil de Portugal as classes
dominantes afastaram o povo da luta, em duras repressões, e por isso perdeu-se
a oportunidade de liquidar o escravismo já em 1822 ou 24, como propunha, embora
dubiamente, José Bonifácio.
·
Perderíamos duas oportunidades de modernizar a
economia brasileira: em 13 de maio de 1888 e no 15 de novembro de 1889, quando
não se promoveu uma mais justa distribuição de terras e controle do poder
absoluto dos latifundiários.
· Canudos será a resposta mais trágica do povo sertanejo, tentando livrar-se da condição miserável a que era submetido pelo grande latifúndio.
CANUDOS: O SOCIALISMO SERTANEJO
- Os sertanejos que se uniram em Canudos tentaram construir uma sociedade socialista, segundo Edmundo Moniz:
“… tendo em vista o fato da burguesia unir-se aos latifundiários quando se apossou do poder político com a proclamação da República em vez de efetivar a reforma agrária, tarefa histórica que lhe competia realizar.”
·
Canudos é movimento raro na história do Brasil: o
único de que não participam as elites intelectuais ou políticas.
·
Todo ele é feito por gente do povo, com ideias
próprias, elaborando um cristianismo peculiar que, ao contrário da visão
predominante, é extremamente lúcido, já que a consciência crítica condiciona-se
à sua realidade social, sua fonte geradora.
· A ideologia de Canudos, portanto, tem que ser entendida a partir de uma realidade material.
A INCOMPETÊNCIA DA BURGUESIA
CRISTÃ
- Intelectuais e jornalistas ligados às classes
dominantes tentaram transformar essa força original e lúcida (Canudos) em
expressão fanática, destacando seu discurso místico.
·
Poucos marxistas, inclusive, percebem que Canudos
nega a religião como “um sol fictício”, como dizia Marx, para se mover “em
torno de si mesmo”.
·
Os intelectuais que reportam e explicam Canudos
fazem-no com a visão de sua classe; são incapazes, justamente por pertencerem
às classes dominantes, de entender a inversão revolucionária que os sertanejos
fizeram – a harmonia entre seus reais interesses de classe e uma ideologia
específica.
· Da mesma forma são incompetentes ou insensíveis para comover-se com a condição humana do sertanejo, visto como o “outro”, o “marginal”, o “jagunço”, o “bandido” ou por fim, como todos eles entendem, inclusive Euclides da Cunha, o inimigo.
PARA O POVO, NA LÍNGUA DO POVO
- Em meio a esse quadro, Antônio Conselheiro vai
pelos sertões, pregando e convencendo o povo.
·
Fala de Deus e da religião, de forma que o povo
entende, que também se fala de justiça e igualdade.
·
Fala da possibilidade de um novo mundo, livre da
exploração e miséria.
· Cita, desmentindo ser um ignorante, os grandes utópicos, como Tomás Morus (filósofo cristão inglês), por exemplo.
JUSTIÇA: INTERESSE DOS MAIS
FORTES
- Prega a obediência civil como reação às leis
injustas.
·
Acontece que no sertão todas as leis são injustas:
a lei é a do senhor latifundiário.
· A “lei civilizada” é ficção para uso e deleite dos intelectuais da elite, influenciados por estranhas “ciências” europeias que os induzem a acreditar que mestiços e pobres são uma raça inferior (darwinismo social).
O LÍDER POLÍTICO
- Desde 1888 Conselheiro vinha sendo seguido por
multidões de ‘gente inferior’ – ex-escravos, vagabundos, marginalizados.
·
Uma de suas primeiras ações nesse período acontece
em Bom Conselho, quando reúne o povo, faz uma breve prédica e manda arrancar o
edital de cobrança de impostos.
·
O povo obedece, queima o edita e faz festa, com
foguetes e banda.
· Começa a trajetória propriamente política do Conselheiro.
O INÍCIO DA UTOPIA
- Uma patrulha de 35 soldados tenta prendê-lo mas é
dispersada pelo povo.
·
Daí para frente será sempre perseguido como um
perigo social.
·
É então que depois de muito ameaçado leva seu povo,
e todos os que chegam, para o Belo Monte e ali funda a sua utopia.
OS SERTÕES
(EUCLIDES DA CUNHA)
Adaptado da net por: Claudio Fernando Ramos, 07/05/17. Cacau “:¬)
PRÉ-MODERNISTA
- A obra Os sertões, de Euclides da Cunha, publicada em 1902 é considerada pré-modernista, haja vista o poder crítico e as profundas convicções sociopolíticas que se destacam na literatura.
A OBRA
- Em Os sertões, Euclides da Cunha usou uma
linguagem grandiloquente e rica em termos científicos, apresentou nessa obra,
no qual o tema principal é a Guerra de Canudos, um verdadeiro retrato do
Brasil no fim do século XIX, discutiu problemas que transcendem o conflito que
ocorreu no interior da Bahia.
·
A obra narrativa mistura literatura, sociologia,
filosofia e história, geografia, geologia, antropologia, por isso sua
preciosidade e grandiosidade.
·
O autor, adepto do determinismo, teoria que afirma
ser o homem influenciado (determinado) pelo meio, pela raça e pelo momento
histórico, dividiu Os sertões em três partes, a saber:
ü A terra (o meio);
ü O homem (a raça);
ü A luta (o momento).
RESUMO
- O livro é dividido em três partes:
A TERRA - é uma descrição detalhada feita pelo cientista Euclides da Cunha, mostrando todas as características do lugar, o clima, as secas, a terra, enfim.
O HOMEM - é uma descrição feita pelo sociólogo e antropólogo Euclides da Cunha, que mostra o habitante do lugar, sua relação com o meio, sua gênese etnológica, seu comportamento, crença e costume; mas depois se fixa na figura de Antônio Conselheiro, o líder de Canudos.
- Apresenta se caráter, seu passado e relatos de como era a vida e os costumes de Canudos, como relatados por visitantes e habitantes capturados.
- Estas duas partes são essencialmente descritivas, pois na verdade “armam o palco” e “introduzem os personagens” para a verdadeira história, a Guerra de Canudos, relatada na terceira parte,
A LUTA - é uma descrição feita pelo jornalista e ser humano Euclides da Cunha, relatando as quatro expedições a Canudos, criando o retrato real só possível pela testemunha ocular da fome, da peste, da miséria, da violência e da insanidade da guerra.
·
Retratando minuciosamente movimento de tropas, o
autor constantemente se prende à individualidade das ações e mostra casos
isolados marcantes que demonstram bem o absurdo de um massacre que começou por
um motivo tolo – Antônio Conselheiro reclamando um estoque de madeira não
entregue – escalou para um conflito onde havia paranoia nacional pois
suspeitava-se que os “monarquistas” de Canudos, liderados pelo “famigerado e
bárbaro Bom Jesus Conselheiro” tinham apoio externo.
·
No final, foi apenas um massacre violento onde
estavam todos errados e o lado mais fraco resistiu até o fim com seus
derradeiros defensores – um velho, dois adultos e uma criança.
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