(O Mítico e o Filosófico)
O QUE É O MITO
Uma Narrativa - Um mito é uma narrativa sobre a origem de alguma coisa:
- A origem dos Astros; da Terra; dos Homens, das
Plantas, dos Animais, do Fogo, da Água; dos Ventos; do Bem e do Mal; da Saúde e
da Doença; da Morte; dos Instrumentos de Trabalho; das Raças; das Guerras; do
Poder; etc.
SEMÂNTICA DO MITO
Origem e Significado - A palavra mito vem do grego, e deriva de dois verbos:
- Do verbo (contar, narrar, falar alguma coisa
para os outros) e do verbo (conversar, contar, anunciar, nomear, designar).
CREDIBILIDADE DO MITO
Um narrador de confiança - Para os gregos, mito é um discurso pronunciado ou proferido para
ouvintes que recebem como verdadeira a narrativa, porque confiam naquele que
narra.
- O mito é uma narrativa feita em público, baseada,
portanto, na autoridade e confiabilidade da pessoa do narrador.
- E essa autoridade vem do fato de que ele ou
testemunhou diretamente o que está narrando ou recebeu a narrativa de quem
testemunhou os acontecimentos narrados.
O POETA DO MITO
O poeta-rapsodo - Quem narra o mito? O poeta-rapsodo! Quem é ele? Por que tem
autoridade?
- Acredita-se que o poeta é um escolhido dos
deuses, que lhe mostram os acontecimentos passados e permitem que ele veja a
origem de todos os seres e de todas as coisas para que possa transmiti-la aos
ouvintes.
- Sua palavra (o mito) - é sagrada porque vem de
uma revelação divina.
- O mito como dogma – o mito é incontestável e
inquestionável.
O MITO COMO GENEALOGIAS
(Cosmogonia/Teogonia)
Cosmogonia - a palavra Gonia vem de duas palavras gregas: do verbo
engendrar (produzir, gerar, fazer nascer e crescer) e do substantivo nascimento
(gênese, descendência, gênero, espécie).
- Gonia, portanto, quer
dizer: geração, nascimento a partir da concepção sexual e do parto.
- Cosmos, por sua vez, quer dizer mundo
ordenado e organizado.
- Assim, a cosmogonia
é a narrativa sobre o nascimento e a organização do mundo, a partir de
forças geradoras (pai e mãe) divinas.
Teogonia - é uma palavra
composta de gonia que
em grego, significa: as coisas divinas, os seres divinos, os deuses.
- A Teogonia é, portanto, a
narrativa da origem dos deuses, a partir de seus pais e antepassados.
ETAPAS DO MITO
A tríade mítica – De três principais maneiras o mito narra à origem do mundo e de tudo
o que nele existe.
1ª MANEIRA
A) Origem sexual – a narrativa mítica busca encontrar o pai e a mãe das coisas e dos
seres, isto é, tudo o que existe decorre de relações sexuais entre forças
divinas pessoais.
- Essas relações geram os demais deuses: os titãs
(seres semi-humanos e semi-divinos); os heróis (filhos de um deus com uma
humana ou de uma deusa com um humano); os humanos; os metais; as plantas; os
animais; as qualidades; como quente-frio; seco-úmido; claro-escuro; bom-mau;
justo-injusto, belo-feio, certo-errado, etc..
B) Uma sequência genealógica – a narrativa sequencial promove uma genealogia, isto é, a narrativa
da geração dos seres, das coisas, das qualidades, por outros seres, que são
seus pais ou antepassados.
Exemplo 1
A origem de Eros (Cupido) - Observando que as pessoas apaixonadas estão sempre cheias de
ansiedade e de plenitude, inventam mil expedientes para estar com a pessoa
amada ou para seduzi-la e também serem amadas, o mito narra (de inúmeras
maneiras) a origem do amor, isto é, o nascimento do deus Eros.
Eros (Cupido) era considerado pelos gregos como o deus do amor. Há
várias versões sobre a história deste deus. Segundo Hesíodo (Teogonia) e
Empédocles (Filósofo, Poeta e Historiador), ele era descendente de Caos, sendo
assim uma divindade primordial. Enquanto o Caos é o representante do vácuo
primitivo reinante no Universo, Eros é a energia que organiza e unifica tudo.
Através dele, tudo passava do estado caótico para a condição cósmica, ou seja,
ao espaço bem ordenado. Depois Eros passou a ser conhecido como um deus
integrante do Olimpo, gerado por Afrodite e Zeus, Hermes ou Ares de acordo com
a interpretação vigente. Ele detinha uma beleza ímpar, atendia aos desejos de
Afrodite, sempre pronto a disparar suas flechas do amor contra mortais e
imortais, conforme as determinações maternas. Representado como uma criança,
explicam algumas versões que Afrodite teria, um dia, reclamado com Métis (Prudência),
que o filho não crescia nunca. A amiga lhe recomendou então ter outro filho, o
que propiciaria o crescimento de Eros. Isso teria realmente ocorrido depois do
nascimento de Antero (Amor Mútuo), eventualmente Antero se opunha ao irmão. Homero
não cita Eros em nenhum momento na sua Odisseia. Cabe a Hesíodo narrar sua
existência pela primeira vez, descrevendo-o como o imortal mais formoso,
sedutor, apto a dominar os corações e a vencer a Prudência. O filósofo grego
Platão (Banquete), narra a gênese de Eros de forma completamente distinta. Ele
o descreve como fruto da disponibilidade de Poros (Expediente), e da carência
constante de Pínia (Pobreza). Na festa celebrada pelos deuses para comemorar o
nascimento de Afrodite, ambos teriam se envolvido e então gerado Eros, protegido
depois por Afrodite, por ter sido concebido no mesmo dia em que ela veio à
vida. Mas, a se acreditar em Platão, Eros seria pobre, sujo e eternamente carente;
um mendigo, herdeiro da personalidade materna e do estilo paterno de estar
sempre à espera de corpos e almas lindos e perfeitos, executando constantemente
ardis sutis e astuciosas intrigas; seria o símbolo do amor necessitado, que não
se concretiza, pois o objeto do desejo sempre escapa de suas mãos.
Exemplo 2
O casamento de Eros com Psique - A história de Eros
e Psique é uma das mais belas e profundas.
Eros se
casa com a amada, mas a proíbe de ver seu rosto, pois deseja ser amado não como
uma divindade, mas como um mortal. Ela, porém, vencida pela curiosidade,
vale-se do momento em que ele adormece e espia sua face; ela fica tão encantada
que deixa uma gota de cera da vela que ilumina seu amado, cair em seu peito.
Eros desperta e fica enraivecido, deixando sua amante. Ela fica sem rumo, ou em
outras versões, é castigada por Afrodite, inconformada com a paixão de seu
filho por Psique; de qualquer forma, arrependido, Eros implora a misericórdia
de Zeus para a mulher amada. O deus supremo cede e torna Psique imortal, unindo
os jovens amantes, que passam a morar no Olimpo. A bela mortal representa,
segundo alguns especialistas, a espiritualidade presente no Homem, o que
transforma esta lenda em penetrante metáfora sobre a relação da alma humana com
o Amor.
2ª MANEIRA
A) Alianças e/ou Rivalidades – O mito traz uma rivalidade ou uma aliança entre os deuses que faz
surgir alguma coisa no mundo.
- O mito narra ou uma guerra entre forças divinas
ou uma aliança entre elas para provocar alguma coisa no mundo dos homens.
- O poeta Homero, na Ilíada, epopeia
que narra a guerra de Tróia, explica por que, em certas batalhas, os troianos
eram vitoriosos e, em outras, a vitória cabia aos gregos.
- Os deuses estavam divididos, alguns a favor de um
lado e outros a favor do outro.
- A cada vez, o rei dos deuses, Zeus, ficava com um
dos partidos, aliava-se com um grupo e fazia um dos lados - ou os troianos ou
os gregos - vencer a batalha.
B) A Guerra de Tróia - A causa da guerra deu-se por conta de uma rivalidade entre as deusas.
- Elas apareceram em sonho para o príncipe troiano
Páris, oferecendo a ele seus dons e ele escolheu a deusa do amor, Afrodite.
- As outras deusas, enciumadas, o fizeram raptar a
grega Helena, mulher do general grego Menelau, esse fato deu início à guerra
entre os humanos.
3ª MANEIRA
A) Recompensas e Castigos – O mito narra as recompensas ou os castigos que os deuses dão a quem
lhes obedece ou a quem lhes desobedece, respectivamente.
- O homem e o uso do fogo - para os homens, o fogo
é essencial, pois com ele se diferenciam dos animais, porque tanto passam a
cozinhar os alimentos, a iluminar caminhos na noite, a se aquecer no inverno
quanto podem fabricar instrumentos de metal para o trabalho e para a guerra.
Exemplo 1
O mito de Prometeu - Um titã (Prometeu), mais amigo
dos homens do que dos deuses, roubou uma centelha de fogo e a trouxe de
presente para os homens. Prometeu foi castigado (amarrado num rochedo para que
as aves de rapina, eternamente, devorassem seu fígado) e os homens também.
Exemplo 2
A caixa de Pandora - Os deuses fizeram uma mulher
encantadora (Pandora), a quem foi entregue uma caixa que conteria coisas
maravilhosas, mas que nunca deveria ser aberta. Pandora foi enviada aos humanos
e, cheia de curiosidade e querendo dar a eles as maravilhas, abriu a caixa.
Dela saíram todas as desgraças, doenças, pestes, guerras e, sobretudo, a morte.
Explica-se, assim, a origem dos males do mundo.
O NASCIMENTO DA FILOSOFIA
(UMA CERTEZA DUVIDOSA)
A filosofia enquanto
cosmologia - a filosofia, ao nascer, é uma cosmologia, uma
explicação racional sobre a origem do mundo e sobre as causas das transformações
e repetições das coisas.
A questão da superação - A filosofia nasce de uma transformação gradual dos mitos ou de uma
ruptura radical com os mitos? Continua ou rompe com a cosmogonia e a teogonia?
Uma verdade dual - Duas foram as respostas dadas pelos estudiosos.
1ª Resposta - Ruptura abrupta (viés científico), dizia-se, então, que a filosofia
nasceu por uma ruptura radical com os mitos, sendo a primeira explicação
científica da realidade produzida pelo Ocidente.
- A primeira explicação foi dada nos fins do século
XIX e começo do XX, quando reinava um grande otimismo sobre os poderes
científicos e capacidades técnicas do homem.
2ª Resposta - Ruptura gradual (viés antropológico), dizia-se que os gregos, como
qualquer outro povo, acreditavam em seus mitos e que a filosofia nasceu,
vagarosa e gradualmente, do interior dos próprios mitos, como uma
racionalização deles.
- A segunda explicação foi dada a partir de meados
do século XX, quando os estudos dos antropólogos e dos historiadores mostraram
a importância dos mitos na organização social e cultural das sociedades e como
os mitos estão profundamente entranhados nos modos de pensar e de sentir de uma
sociedade.
Abordagem contemporânea - Atualmente, consideram-se as duas respostas exageradas e afirma-se
que a filosofia, percebendo as contradições e limitações dos mitos, foi
reformulando e racionalizando as narrativas míticas, transformando-as numa
outra coisa, numa explicação inteiramente nova e diferente.
MITO E FILOSOFIA
(Diferenças e Relações)
1ª DIFERENÇA: TEMPORALIDADE
Mito (tempos imemoriais) - O mito pretendia
narrar como as coisas eram ou tinham sido no passado imemorial, longínquo e
fabuloso, voltando-se para o que era antes que tudo existisse tal como existe
no presente.
Filosofia (passado, presente e
futuro) - A filosofia, ao contrário, preocupa-se em
explicar como e por que, no passado, no presente e no futuro (isto é, na
totalidade do tempo), as coisas são como são.
2ª DIFERENÇA: ORIGEM
Mito - O mito narrava a origem através de genealogias e rivalidades ou
alianças entre forças divinas sobrenaturais e personalizadas.
- O mito falava em Urano, Ponto e Gaia.
- O mito explica o surgimento desses seres,
principalmente, por meio de relação sexual, rivalidades e alianças entre os
deuses, os heróis e humanos.
Filosofia - a filosofia explica a produção natural das coisas por elementos e
causas naturais e impessoais.
- A filosofia fala em céu, mar e terra.
- A filosofia explica o surgimento da realidade por
composição, combinação e separação dos quatro elementos - úmido, seco, quente e
frio, ou água, terra, fogo e ar.
3ª DIFERENÇA: COERÊNCIA
Mito - o mito não se importava com contradições, com o fabuloso, com o
fantástico e com o incompreensível.
- A confiança e a crença no mito vinham da
autoridade religiosa do narrador.
Filosofia – a filosofia não admite contradições, fabulação e coisas
incompreensíveis, mas exige que a explicação seja coerente, lógica e racional.
- Na filosofia autoridade da explicação não vem da
pessoa do filósofo, mas da razão, que é a mesma em todos os seres humanos.
Bom!
ResponderExcluirÓtima explicação!
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